“Sinto, logo escrevo.” É assim que Alexandrina Pereira resume o impulso que a move desde a adolescência. “Comecei a escrever poesia por volta dos 15 ou 16 anos, porque estava enamorada ou porque queria dizer as coisas de uma outra forma.”
O hábito da escrita manteve-se, mesmo durante os anos em que trabalhou numa multinacional. “Houve um concurso de poesia na empresa e eu ganhei. Havia ideias que me surgiam de madrugada. O diretor, Orlando Curto, elogiou-me e incentivou-me a continuar a escrever.”
Casou cedo com o homem que ama há 52 anos e de quem viveu afastada durante a guerra colonial. As cartas eram refúgio e acompanhadas de poemas sobre a saudade, o medo e a esperança.
Com os dois filhos no conservatório, surge um novo capítulo: a música. “O professor deles, Artur Jordão, desafiou-me a fazer letras para canções infantis.” Aceitou e nunca mais parou.
Durante mais de uma década, colaborou com diversos compositores. “Cheguei a representar Portugal no famoso festival internacional musical infantil Sequim d’Ouro, em Itália, em 1998 e 2008.”
No total, Alexandrina Pereira escreveu mais de 50 letras para crianças de todo o país e ganhou cerca de duas centenas de prémios.
Apesar do reconhecimento, rotulavam-na de “a poetisa das crianças”. “Achava injusto, porque também escrevia crítica social.”
Publica o livro “Riscos”, com textos de intervenção, com críticas políticas e homenagens a nomes como Zeca Afonso.
Nascida em Setúbal há 78 anos e residente em Palmela há mais de 40, Alexandrina Pereira mantém um forte vínculo com a terra natal. “Setúbal é o meu centro, é aqui que me realizo culturalmente.”
Participa ativamente, enquanto dirigente ou membro, em associações culturais e sociais, sempre com o objetivo de contribuir para a comunidade. “A vida é tão breve, a nossa passagem só faz sentido se deixarmos algo de bom. A minha maior alegria é saber que ajudei, que contribuí para um mundo melhor, mais humano.”
A infância, humilde, moldou-lhe a visão do mundo e a forma de escrever, a qual, diz, deve ser “simples, direta e sem intelectualismos excessivos para que qualquer pessoa, mesmo sem experiência literária, possa entender e sentir”.
Sentir. A palavra-chave de Alexandrina, para quem a escrita nasce da emoção. “Seja para as marchas populares, fados ou homenagens, é preciso escrever com sentimento, preciso de sentir para escrever bem. É esse envolvimento que, acredito, dá força aos meus poemas e pode justificar o reconhecimento que tenho recebido ao longo dos anos.”
A inspiração pode surgir a qualquer hora, e Alexandrina aprendeu a não desperdiçar nenhum momento. A sensibilidade, acredita, é uma compensação divina pelos anos difíceis da infância.
Sempre com ideias a fervilhar, acorda a meio da noite para anotar frases. “Tenho sempre um bloco de notas na mesa de cabeceira.”
Atualmente, dedica-se a organizar o seu legado literário. Está a reunir poemas escritos por encomenda no livro “Pediram-me um Poema”. Escreve também a sua biografia, não para publicação imediata, mas para que os netos conheçam a história da avó.
Alexandrina Pereira é uma mulher que vive intensamente, ama profundamente, escreve com o coração, continuando a surpreender e a inspirar gerações.