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Eu e a aldeia
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Eu e a aldeia

maio 2025

A vida quase centenária de Marc Chagall foi passada entre a Rússia, a França, regresso à Rússia, de novo a França, os Estados Unidos e outra vez a França. Apesar desse percurso atribulado, que apanhou as duas guerras mundiais e a revolução russa, a sua pintura está quase sempre impregnada duma grande carga poética.

Ele podia ter representado ou aludido aos horrores das guerras, mas são raras as vezes onde isso lhe serve de mote. Quase toda a sua obra assenta em recordações de infância e vivências de adulto, em ambientes bucólicos ou intimistas, impregnados de felicidade e de amor.

Chagall teve formação académica mas cedo se mostrou permeável às novidades surgidas nas primeiras décadas do século XX, assimilando influências do fauvismo, do expressionismo, do cubismo e, mais tarde, do surrealismo. Contudo, ele já havia enveredado por uma pintura metafísica, antes de aparecer o surrealismo.

A sua pintura apresenta processos que conduzem a uma estética muito peculiar, onde surgem sobreposições, transparências, cores antinaturais, figuras e objetos em diferentes escalas, perspetivas distorcidas, pessoas e animais livres da força da gravidade, como que levitando ou de cabeça para baixo. Em suma, ele desconstrói a realidade visível para construir uma realidade pictórica própria e autónoma.

O quadro Eu e aldeia assenta em recordações de vivências campestres, onde é evidente a relação com os animais. Trata-se duma obra de juventude mas que apresenta já várias das caraterísticas das que virá a fazer numa fase mais madura.

Em primeiro plano está um homem de rosto verde frente a um bezerro, com um ramo florido na mão, que parece oferecer-lhe. Dentro da cabeça do bezerro, uma mulher ordenha uma vaca com botas. Ao fundo, um casal de camponeses dirige-se para o trabalho agrícola, junto do qual estão algumas habitações humildes, duas delas de telhado virado para baixo. Duma igreja espreita uma cabeça. O bezerro tem um colar de pequenas esferas multicores, do colar do homem pende uma cruz.

Planos de cores atravessam o quadro, misturando os fundos com as formas, numa rara e muito peculiar demonstração de liberdade compositiva.

António GalrinhoArtista plástico

 

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