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Guia de Eventos de Setúbal

Cristo perante Pilatos
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Cristo perante Pilatos

setembro 2025

Excelente retratista, excelente pintor de composições complexas, grande conhecedor da anatomia, da perspetiva e dos efeitos da luz nos corpos, objetos e espaço em geral, Tintoretto surpreende sempre. E surpreende também pela velocidade com que pinta e pelas grandes dimensões que, por norma, os seus quadros possuem. Este Cristo perante Pilatos aparenta ter dimensões medianas mas, na realidade, tem mais de cinco metros de altura por quase quatro de largura.

Tintoretto é também um mestre da teatralidade, presente nas dinâmicas dos corpos, nos gestos, na diversidade de expressões faciais, na indumentária muitas vezes exótica e na artificialidade da luz. Também experimentou enquadramentos fora do comum, como aquele que surge nesta obra, dando a impressão de se tratar dum quadro amputado.

De facto, a cena parece prolongar-se para o lado esquerdo, para onde se dirige o ponto de fuga e de onde chega uma multidão de pessoas com o intuito de assistir ao que se passa. Apesar de, numa primeira observação, o nosso olhar ser puxado para esse lado, logo estaciona na cena central, onde estão Cristo, Pilatos e um criado deste que faz verter água nas suas mãos, precisamente no centro físico do quadro.

Podemos até pensar nesta obra como um díptico, cujo painel do lado esquerdo existe apenas na nossa imaginação. Não é descabido fazer esse jogo, pois sente-se perfeitamente que uma horda de pessoas se prolonga para lá das que estão à vista, deixando Cristo ainda mais vulnerável.

Cristo está como Ecce homo (“Eis o homem!”), cabisbaixo e manietado, mas sereno perante o governador da Judeia que proferiu tais palavras e que está prestes a condená-lo à morte por crucificação, cedendo à vontade da multidão. Daí o lavar das mãos, que significa o não assumir a responsabilidade. Repare-se que Pilatos não olha para o seu réu, o que acentua a insegurança com que tomou a decisão.

A artificialidade da luz é evidente na túnica branca de Cristo e na do escriba, certamente aludindo a S. João, que terá estado presente na ocasião, quando jovem, e sobre ela escrito no seu Evangelho, quando já de idade avançada. Daí o anacronismo.

António GalrinhoArtista plástico

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